Dublin, 25.07.2010
Minha amiga Ruta, da Lituânia, tinha ido ao banheiro e eu travei a porta por fora com uma vassoura. Era começo de domingo, nosso dia favorito de trabalho no coffee shop. Sem chefe, sempre podíamos fazer coisas importantes, como esconder o avental dos colegas, criar pesonagens com comida, servir leite integral quando o cliente pedia desnatado...
Mas Ruta estava triste naquele dia, por isso precisei trancá-la no banheiro. Enquanto ela me xingava, usei chantilly e geleia de framboesa pra desenhar um rosto numa enorme cabeça de brócolis. Depois deixei a surpresa na cozinha, tirei a vassoura da porta e saí correndo.
Quando voltei, Ruta já tinha dado ao brócolis o nome de Suzy. Bagunçamos com ela na cozinha até que a lei da gravidade derrubou nosso brinquedo. Como castigo, tivemos que limpar o chantilly gorduroso do piso. Suzy tomou banho e virou salada. Mas foi um final feliz. Durante poucas horas em que viveu, ela fez minha amiga sorrir.
Noutro domingo, algumas semanas antes, vi uma moça limpando a janela de uma lanchonete. Ela esfregava o vidro como se tivesse o pior emprego do mundo. Acontece que ninguém poderia dizer, apenas olhando, se o problema era mesmo o trabalho. Também poderia ser uma doença, briga de família, saudade ou outro tipo de dor.
Uma senhora passou e disse:
"Você tá ótima hoje. Belo vestido!"
Foi como mudar um interruptor. Imediatamente a limpeza do vidro passou a parecer o trabalho dos sonhos. A menina não conseguia disfarçar a alegria. E a velhinha seguiu andando, sem saber que o galanteio inocente fez o dia da outra valer a pena.